/Como Se Olham, Pais e Filhos?

Jorge Forbes

Artigo publicado na revista WELCOME Congonhas, fevereiro de 2008 – ano 1 – número 11.

No desencontro temporal há uma chance de presente

Aos olhos dos pais, o adolescente de hoje é alienado politicamente, não faz passeata, nem comício, nem briga por um partido; é instável, não sabe o que quer, começa uma faculdade, muda para outra, volta para a anterior; é incompetente, não pensa em sair de casa, gosta de ser filho-canguru; é indefinido amorosamente, fica, fica, mas não se estabelece; é de um péssimo gosto musical, adora o barulho do bate-estaca e, ainda por cima, fica dançando sozinho em festas que atravessam as madrugadas, em lugares inóspitos. Aos olhos dos pais sua família não tem futuro, seus netos, se tiver, estão perdidos, sua vida fracassou.

Aos olhos dos filhos, não é nada disso, está ligado?
Aos olhos dos filhos não tem sentido fazer política, se o que se chama de políticos é um bando de salafrários que roubam dinheiro de ambulância, que escondem dólares na cueca, que mantêém amásias com verbas públicas, que mudam de legenda pelo interesse do momento. Chamar a isso de política, de políticos? Contestá-los seria reconhecê-los, avisa o adolescente de hoje, a pais que não entendem. A política da globalização não pede reforma, pede reinvenção.

Aos olhos dos filhos o atual mundo mix quer combinar saberes, mais que estudos estáveis mono-disciplinares, por isso articulam seus cursos, como seus amigos e suas músicas. Eles não se preparam para uma profissão, mas para múltiplas atuações; avisam que isso não é instabilidade, mas flexibilidade criativa.

Aos olhos dos filhos eles não ficam na casa dos pais, mas na sua casa que é também a dos pais. Eles trazem suas namoradas e namorados para dormirem em casa, sem se sentirem intimidados; eles comem na hora que levantam, ou que chegam, o microondas deu-lhes independência do relógio familiar. Sim, são cangurus, se quisermos, mas mais por prazer que por dependência.

Aos olhos dos filhos o maior valor do encontro não é o estabelecimento, por isso variam com quem ficam. Mas podem ficar muito tempo com um só também. Nos dois casos, é um novo tipo de amor de responsabilidade direta que se esboça; um amor sem intermediários, ou seja, sem nenhuma razão outra que a vontade de estar junto.

Aos olhos dos filhos os festivais da Record com suas bandeiras de luta, envelheceram. Os que criticam a house, a techno, a trance, aplaudem o violão jogado por Sérgio Ricardo? O romantismo de Taiguara? O barquinho que vai, foi. Filhos diriam que a música eletrônica está demonstrando a possibilidade de um novo tipo de laço social, em que os diferentes se articulam: monólogos articulados, para desespero dos iluministas.

Aos olhos dos filhos, os olhos dos pais estão embaçados da saudade; aos olhos dos pais, os olhos dos filhos estão iludidos do futuro. Nesse desencontro temporal há uma chance de presente.