Jorge Forbes
Nada parecia perturbar a tranqüilidade aveludada daquele tradicional hotel, solidariamente ancorado às margens da Avenida Montaigne, em Paris. Meus pensamentos devaneavam, observando o velho pianista tocando, no velho piano, velhas canções para um público de época. Senhoras coquetes, de cabelos azulados, tomavam, repousadamente, o chá da tarde com suas amigas, igualmente empertigadas. Senhores bengalados folheavam jornais ingleses nas poltronas de couro dos cantos. Alguns ricos petrolificados árabes sorriam seus dentes de ouro, protegidos por desconfiados seguranças.
De repente, escuto um acorde dissonante. De onde vinha aquela batida rápida e perturbadora de piano? Teria o modorrento pianista incorporado de surpresa um espírito agitado? Olhei para ele e nem um fio dos restantes cabelos se mexia. Agora, além de um piano, ouvia-se também bateria, baixo e guitarra. Levantei-me disposto a descobrir aquela fonte inusitada. Atravessei dois corredores e me encontrei em uma sala não muito grande, estilo regência, com grandes portas dando sobre um pátio interno, iluminado por um poético entardecer. Um pequeno conjunto musical ensaiava para oitenta cadeiras vazias, elegantemente dispostas. Somente duas cadeiras, na quarta fila, lado a lado, eram ocupadas por duas silenciosas japonesas. Olho para o moço do teclado e reconheço Lionel Richie, ele mesmo, que uma semana antes havida feito o show do Oscar para uma audiência televisiva de mais de um milhão de espectadores. Acomodei-me dois metros atrás das japonesas, tentando ser tão discreto quanto, não querendo perder aquele momento único. Poucas músicas depois, uma loira barulhenta irrompe naquele espetáculo particular. Foi fácil compreender que se tratava da empresária. Depois de rápidos acenos aos músicos, dirigiu-se às japonesas que partiram logo após uma breve conversa. Em seguida, veio até meu lugar e explicou-me que aquilo se tratava de um curto ensaio para um concerto privado que ocorreria dali a menos de uma hora. Não esperei o final da explicação para, de pé, começar a me despedir. Foi quando então ela me perguntou:
A aflição dela era tanta que achei que perderia menos tempo se ficasse os dez minutos pedidos do que se fosse embora e causasse nela uma crise de angústia, o que acabaria me levando a um atendimento de urgência, seguramente mais demorado do que aqueles minutos. Resolvi ficar e ali, sozinho, senti-me representante de dois bilhões de ouvidos. Que responsabilidade. Pontualmente, dez minutos passados, levantei-me, passei por ela, que conversava com três funcionários e, de longe, acenei, agradeci e disse-lhe adeus. Em uma última e desesperada tentativa, ela ainda me perguntou:
Impossível excluir ninguém…