/Tratando a Corrupção

Jorge Forbes

Artigo publicado na revista WELCOME Congonhas, agosto de 2007 – ano 1 – número 5

– Será que aquele passageiro que corta a fila de embarque, que atravessa sinal vermelho, que pirateia música e vídeo, tem ‘moral’ para se indignar com o festival de corrupção que assola Brasília?

– É uma pergunta freqüente, que traz uma afirmação embutida, a saber: que vivemos em uma crise moral e que se disciplinarmos a sociedade, tudo se resolverá. Não há saída por aí, no círculo vicioso entre governantes e governados. Governados cometem pequenas imoralidades, liberados pelas grandes imoralidades dos governantes; estes não mudam porque são sempre reeleitos pelos governados, em uma perversa cumplicidade. Enquanto não nos conscientizarmos do novo laço social que se instaurou com a globalização, muito diferente do anterior, continuaremos a nos frustrar com soluções inócuas, que só aplacam momentaneamente a ansiedade pública.

– A honestidade estaria em baixa, em um tempo de cada um por si, no qual o errado virou aceitável?

– Não acredito que a honestidade esteja em baixa, a não ser para os saudosistas que compreendem a honestidade pela maior ou menor aproximação a um padrão pré-estabelecido do que seja honesto. Isso funcionava bem na sociedade industrial, que era uma sociedade vertical obedecendo a universais de comportamento catalogados em ideais. Para estes, sim, bom era o mundo ‘honesto’ de ontem. Nosso momento atual é muito mais complexo e rico, não se medindo pelo maniqueísmo confortável do certo e do errado. Isso pode levar a pensar que defendo o relativismo das ações, o que não é absolutamente o caso. O homem de hoje, confrontado à incerteza da quebra dos padrões, mais que nunca é chamado a uma responsabilidade subjetiva essencial.

– Como salvar o Brasil da corrupção?

– Nem aqui, nem na China, ficaremos totalmente livres da corrupção. Mas podemos diminuí-la, em freqüência e em importância. Em freqüência, na medida em que consigamos reverter a tendência atual das pessoas preferirem se esconder em seus carros blindados e em suas protegidas ruas sem saída – mais sem saída que protegidas – e retornem a ver o outro cidadão como seu potencial amigo e não como seu potencial assassino. Impossível, utópico? Penso que não, mas para isso é preciso mudar o paradigma. Erra quem pensa que 500 anos de corrupção só se resolvem em 500 anos de limpeza. A mudança, hoje, se faz como uma epidemia, muito rápida. Ficamos nos perdendo – é o que queria dizer sobre a importância – discutindo currículos de supostos políticos e inventando reformas políticas salvadoras. Qual o quê! Como cantou o Chico. Está na hora de ver o óbvio: que tem muito ladrão, só ladrão, simplesmente ladrão, disfarçado de político e que o necessário é uma reinvenção radical do homem -político, que já começou, só que não a percebemos.